As portas de banheiros de bares da noite tem muito mais sabedoria e filosofia do que muitos livros e discursos e teses que andam por aí, empoeiradas em estantes e bibliotecas. “Não falta amor. Falta amar”. Leu a sentença rabiscada na porta do toalete feminino de uma balada. “Verdade”, pensou.
Um belo dia, na beirada da meia idade, resolveu abandonar a vida de casada e mulher de família para viver a solidão, a solteirice que pouco teve. Viveu enrolada em relacionamentos longos por anos a fio. Amou, foi amada, viu estrelas, ouviu sininhos e sentiu borboletas revirarem seu estômago. Nunca levou um fora, nunca recebeu um não. Sempre fez sexo com amor, nunca deu só por dar. E achou que agora precisava aventurar, correr riscos, abalar suas próprias estruturas pra ver até onde seria capaz de suportar. Era uma mulher muito bonita, homens não haveriam de lhe faltar.
Fez as malas, saiu de casa, deixou o marido na sala deserta do enorme apartamento que haviam comprado. Foi viver a vida por si só num JK alugado. Comprou um jeans bem justo, uma blusa bem decotada e um par de sapatos de salto bem alto. Saiu pra noite. Sozinha. Experiência única e reveladora. Conheceu um sujeito. Beijaram-se. Aceitou ir pra casa dele logo no primeiro encontro. Transaram. Se foi bom? Digamos que foi aceitável. Não foi sua melhor performance, mas mesmo assim saiu de lá na manhã seguinte tão satisfeita quanto um leão faminto depois de abater um filhote de antílope na savana e se deliciar com a sua carne.
Se encantou por um colega de academia que a correspondeu. Saíram, ficaram e só. Sobraram músculos mas faltaram atitudes no sujeito e ele foi logo limado da lista. Preferia um selvagem que rasgasse logo as suas roupas do que um panaca que não tinha ideia do que fazer com as mãos.
Transou com um cara que havia casado há pouco. Depois com outro que vivia no bate e volta com uma namorada feia. Pecado, ele era tão lindo e gostoso, merecia coisa melhor. Deu pra um sujeito que conheceu no congestionamento. Transou com alguns no primeiro encontro. Fez charminho pra outros e resolveu que iria pros finalmentes só depois da terceira saída. Teve experiências interessantes e outras pouco ortodoxas. Gozou e fez gozar. E assim foi montando sua coleção, engrossando a lista, acumulando horas de cama. Empilhando corpos, como ela mesma dizia. Porque eram só corpos e todos sem coração. De vez em quando se sentia usada, mas quando isso acontecia logo tratava de ter uma conversa consigo mesma e mudar esse discurso. “Quem usa aqui sou eu”. Deu muito.
E de tanto dar acabou se esvaziando. Foi ficando murcha tal qual um balão de aniversário infantil quando a festa termina. Começou a sentir falta de algo mais além do sexo pelo sexo. Queria brilho nos olhos, contar pintinhas no depois, descobrir dobras e cheiros, dormir de conchinha, levar café na cama no dia seguinte, passear de mãos dadas. Não queria mais só um corpo estendido na cama, queria um coração também. Mas essa opção parecia extinta do mercado. O produto amor tinha saído de linha, esgotado nas prateleiras e não haveria reposição ou segunda edição. Ao mesmo tempo em que muitos caras lhe diziam que queriam casar e constituir família, nenhum deles parecia disposto à se apegar, se entregar e abraçar uma relação com tudo o que ela tem direito e dever. Alguns diziam que não conseguiam nem se apaixonar, inclusive os que já tinham esposa e filhos em casa.
Lembrou então da frase que havia lido há algum tempo na porta do banheiro de um bar e confirmou a teoria: não faltava amor, mas amar.
Por Menina de Ar